Como evitar problemas dos motores a diesel

Visitamos a Escola do Diesel Mack Boring, nos EUA, para desvendar os segredos da manutenção desses motores

por Pete McDonald
Fazer a manutenção preventiva do motor evita surpresas desagradáveis

O fim de semana chegou e justamente na hora de botar o barco na água e dar a partida, uma pequena surpresa acaba com sua alegria: o motor não liga de jeito nenhum. Você tenta encontrar o problema, mas nada… De repente, você se lembra que esqueceu de fazer sua revisão periódica. Grande erro, amigo…

Esse tipo de situação é extremamente comum, e muitas vezes se resume a um anel de borracha de centavos. No entanto, para fazer esse conserto, será cobrada uma conta pra lá de salgada. Grande parte dos problemas acontece exatamente pela falta de manutenção preventiva, infelizmente uma das últimas preocupações dos proprietários.

Para prevenir futuros problemas – e contas altas –, visitei a Mack Boring, em Nova Jersey, uma das maiores distribuidoras de motores a diesel marítimos nos Estados Unidos, para conversar com Larry Berlin uma referência profissional do segmento. Ele enumerou os quatro aspectos-chaves a se observar para a saúde dos motores a diesel marítimos: lubrificação, refrigeração, eletricidade e combustível.

LUBRIFICAÇÃO

Larry começou com uma frase de efeito: “Barcos não são como carros. O esforço do motor em um barco é como se você estivesse subindo uma serra durante o dia todo! Portanto, quem não acredita em manutenção preventiva não ficará livre de problemas”.

Segundo ele, o óleo é o primeiro e mais importante componente para não só reduzir o atrito entre as partes móveis, como também para manter a temperatura dos pistões e cilindros (e não o sistema de arrefecimento). O óleo também protege as paredes dos cilindros, hastes de válvulas e turbo compressores, prevenindo contaminações e corrosões.

Felizmente, o sistema de lubrificação é de fácil manutenção. Troque o óleo e os filtros com base nas horas de uso do motor (ou conforme a recomendação do fabricante) ou, no mínimo, uma vez ao ano. Segundo Larry, o período para a troca ideal é no outono, pois o óleo velho torna-se ácido e corrói o interior do motor durante os meses de menos uso.

Outra dica é puxar a vareta e verificar se o nível do óleo está dentro das especificações antes de cada uso do barco. “Ignore a cor e o aspecto, pois elas não determinam a vida útil do óleo, somente horas de motor o fazem”, afirma.

Ele recomenda também trocar o filtro, juntas e os retentores de acordo com as especificações no manual do proprietário. Use sempre o filtro de óleo indicado para o motor, uma vez que um errado pode danificá-lo ao restringir o fluxo.

Caso seu motor tenha um reservatório externo (cárter seco), siga o trajeto do óleo até o motor. Procure sinais de danos ou ferrugem, pois a corrosão e/ou rompimento de um tubo desses podem levar a vazamentos responsáveis por parada do motor em um piscar de olhos.

Ainda que a manutenção do sistema de óleo lubrificante em si seja uma tarefa fácil, é ele que, normalmente, menos dá sinais de que há algo errado. Monitore o instrumento que indica a pressão do óleo e não confie apenas naquela luzinha vermelha – que muitos acham inútil – que acende quando a pressão cai abaixo de 7 psi. Outra boa ideia é marcar e memorizar a pressão de óleo que seu motor apresenta em determinados regimes de rotação usuais. Se houver alteração, fique de olho! Não espere os sintomas se agravarem, cuide de seu motor!

REFRIGERAÇÃO

Esse item é responsável por muitos problemas no motor. “O entupimento do filtro de água do mar é a causa número um de falhas no sistema de arrefecimento”, explica Larry. Filtros comprometidos impedem que a água do mar resfrie a água do motor, colocando o sistema em risco.

Esse sistema é formado por dois componentes básicos. A bomba externa ao motor puxa a água do mar através de um captador externo ao casco e de um registro específico. Normalmente, essa água passa por um refrigerador de óleo lubrificante e, em seguida, por um trocador de calor que resfria a água interna do motor – a famosa “mufla”. No final, a água do mar é injetada no cotovelo de saída do escapamento, onde resfria os gases de escape que estão a mais de 700°C. Eles caem para temperaturas abaixo de 100°C durante seu caminho para fora da embarcação.

O sistema de água doce, por sua vez, é um circuito fechado dentro do motor que circula água com seus aditivos entre seus componentes “quentes”, como o bloco de cilindros, o cabeçote e a turbina. Quando um motor frio entra em funcionamento, um termostato regula o fluxo de água até que ele atinja a temperatura ideal, normalmente ao redor de 85°C, e o mantém assim. Em seguida, ele passa pelo trocador de calor. Essa válvula é muito importante, pois um motor que trabalha abaixo da temperatura ideal está sujeito a desgaste e à carbonização excessiva.

O rotor de uma bomba de água danificado é outro problema muito recorrente. Um rotor saudável parece uma engrenagem, com aletas de borrachas que se flexionam enquanto a bomba gira. Durante sua vida útil, o material se desgasta e enrijece a ponto de fazer com que as aletas se rompam, impedindo que a bomba envie a quantidade de água necessária para os motores. Assim, basta que o rotor seja substituído por um novo conforme a indicação do fabricante ou uma vez a cada início de temporada. Se quiser ao menos inspecioná-lo para considerar a sua troca você deve abrir a tampa da bomba e retirá-lo com um sacador de rotor, item parecido com um daqueles saca-rolhas com braços. Esse sacador pode ser encontrado nas boas lojas de equipamentos náuticos. Se tiver sorte, o fabricante do seu barco já instalou a bomba de modo a permitir que faça você essa operação sem desmontá-la. Caso contrário, a bomba terá de ser removida. Contudo, antes de instalar a nova peça, lubrifique o interior da bomba e o rotor com o material fornecido com ele. Ou então, acredite, use azeite de oliva extra virgem! E nunca use lubrificantes baseados em petróleo, pois normalmente degradam o rotor.

Colocá-lo de volta no lugar requer mais atenção do que removê-lo. Cada parafuso no motor – na verdade, cada braçadeira de mangueira – deve ser apertado com um torque específico e uma sequência de aperto. Verifique no manual do proprietário quais são as recomendações quanto ao torque e ao padrão de aperto das porcas. Use um torquímetro para atender às especificações.

A manutenção da tampa de pressão do reservatório de expansão é o item mais fácil a ser feito. Ela precisa selar devidamente o reservatório para que a pressão ali gerada aumente o ponto de ebulição da água de 100 °C para 121 °C. Se não, a água no seu motor irá ferver e o sistema superaquecerá. Verifique se a tampa veda bem e se as juntas estão em bom estado. Substitua, se for o caso.

Troque também o aditivo para água de radiador a cada dois anos. Utilize apenas aquele com prazo de validade maior e sempre o misture com água destilada na proporção recomendada pelo fabricante.

Outro item a ser verificado é o cotovelo de escapamento com injetor de água, onde gases de escapamento e água salgada são misturados antes de serem enviados para fora da embarcação. Ao olhar dentro da peça, verifique se ela está bloqueada por corrosão ou material depositado. “Essas peças devem ser trocadas a cada três anos, mas ninguém o faz”, adverte.

Quanto à refrigeração interna, o termostato deve ser checado regularmente. Ele abre e fecha entre cem e mil vezes por minuto, a fim de regular o fluxo do líquido de refrigeração. Embora extremamente confiáveis, essas peças eventualmente apresentam defeitos. Larry ensina um teste simples: remova-o do motor, passe uma linha ou barbante no meio da válvula, segure a parte superior da linha e mergulhe em um recipiente em que possa aquecer a água. Esquente-a gradualmente e, quando a válvula abrir e soltar o barbante, meça a temperatura da água e verifique o tamanho do orifício de abertura. Caso não esteja de acordo com as especificações, substitua-o.

Há outros cuidados de manutenção mais complicados, como a remoção do trocador de calor para enviá-lo à limpeza, o que deve ser feito a cada três anos. Em grande parte dos motores, a remoção é um trabalho de três horas que envolve a desmontagem de outras peças e acessórios. Essa retirada não deve ser feita em hipótese alguma por amadores, especialmente no caso de motores de injeção direta e controlados eletronicamente.

ELETRICIDADE

O sistema elétrico CC (Corrente Contínua) é outro item a ser verificado, mas é o que menos pode causar danos a um motor à diesel. Se o sistema elétrico falhar, o motor não vai superaquecer ou fundir, apenas não dará partida. Por outro lado, se o motor não ligar e você estiver à deriva ou a milhas do porto mais próximo, isso vira um problemão!

Conexões frouxas ou sujas são um problema recorrente em sistemas de corrente contínua, porém ninguém as verifica”, ensina. O cabo que vai da bateria até o motor de arranque é fundamental: cheque essas conexões primeiro. Verifique também os fios do interruptor de pressão de óleo (cebolinha), do medidor de temperatura da água e da chave geral das baterias. Qualquer fio envolvido no monitoramento do motor precisa ser checado!

Fusíveis muitas vezes são responsáveis por mau funcionamento e devem ser inspecionados. Tenha sempre uma seleção reserva a bordo. Confira também o estado geral do motor de arranque, com atenção especial para um interruptor de partida (solenoide) desgastado ou um Bendix defeituoso.

Se checado regularmente, o alternador deixa de ser uma fonte frequente de preocupações. “Fui chamado por um proprietário porque suas baterias não estavam carregando e descobri que o alternador é que estava frouxo”, lembra Larry.

Verifique se os parafusos que prendem o alternador no lugar estão devidamente apertados. Cheque sempre se as correias são do tamanho e tipo certos para o seu motor e que estejam com a devida tensão. O conselho vale para todas as correias do motor, responsáveis também por um possível superaquecimento se estiverem muito frouxas. Lembre-se de sempre seguir a recomendação do fabricante. Além disso, existem ferramentas específicas que facilitam esse ajuste.

COMBUSTÍVEL

Por inúmeras razões, o combustível é um dos maiores vilões dos motores à diesel.

Antes de tudo, deve-se  manter o tanque de combustível sempre cheio para evitar ou minimizar o crescimento microbiano. E na hora de abastecer, deve-se sempre optar por postos confiáveis que comercializam diesel náutico. Em seguida, utilizar um bom pré-filtro separador de água e aditivos conservantes de combustível. Caso veja água, drene e ligue o motor novamente. Se aparecer uma segunda vez, seu combustível é ruim ou está contaminado.

Na maioria dos motores diesel, é fundamental o proprietário saber como “sangrar” o motor caso entre ar no sistema de alimentação e o desligue. Localize e solte o parafuso de sangramento (deve haver uma mangueira transparente conectada a ele) e o acione à bomba manual até que saia diesel, sem as bolhas de ar. Se isso não funcionar, solte a tubulação de injeção nos bicos injetores para fazer as bolhas de ar escaparem por lá até que haja um fluxo constante de combustível.

Procure sempre recolher esse óleo diesel antes que ele caia no porão. Se não for possível e ele vazar, Larry sugere um jeito para eliminar o cheiro: detergente de lavar louça, de preferência com aromas cítricos!

Finalmente, Larry recomenda: conheça os seus sistemas, aprenda como funcionam e faça ou supervisione você mesmo a manutenção preventiva do seu barco. Se for desmontar algo, tire fotos passo a passo com o celular para lembrar-se como montar depois!

Saiba onde não mexer durante a manutenção do motor:

NÃO FAÇA VOCÊ MESMO

Ajustes de válvulas: motores a diesel exigem regulagens periódicas de suas válvulas. Mas é trabalho muito técnico e que tem consequências desastrosas se feitos de forma incorreta. Melhor deixar isso nas mãos dos profissionais!

Reaperto do(s) cabeçote(s) do motor: os cabeçotes de cilindros devem ser reapertados em intervalos regulares, de acordo com o uso (veja seu manual). É preciso seguir as exatas especificações ou o motor pode ser danificado. É outra situação em que vale a pena pagar por serviços profissionais.

Turbocompressores: eles exigem serviço de profissional, de acordo com as especificações. Melhor deixá-los com o mecânico.

ECM e injeção direta: para motores com controle eletrônico e de injeção computadorizada (common rail), atenha-se aos itens básicos desse artigo e deixe um técnico treinado plugar seu computador no motor e executar os ajustes necessários.